sexta-feira, 22 de outubro de 2010

O mato do tigre e o campo do gato

         O que comemoramos no dia 22 de outubro? Faço a pergunta porque somos instigados a decorar datas desde os primeiros anos de colégio. Quem descobriu a América? Em que dia? Qual a data que marca o início da primeira guerra mundial? E a da queda da bastilha? Chegavam a me obrigar a saber o dia em que Constantinopla foi tomada pelos turcos! Pode uma coisa dessas? O interessante é que a história do Brasil, a nossa história, ficava em segundo plano. Claro, em segundo, não, em quarto, quinto e sexto. Quer saber se tenho razão? Entre nos portais de história, nos sites de governos e procure saber o que aconteceu no dia 22 de outubro. Se você é catarinense, acesse o site do governo de Santa Catarina. Duvido, com tudo quanto é tipo de D, que você encontre o fato mais marcante na história catarinense ocorrido nessa data.
          Na manhã de 22 de outubro de 1912, no local chamado Banhado Grande, foi acesso o estopim daquela que seria a maior guerra envolvendo o exército brasileiro em nossas terras – a Guerra do Contestado. O Banhado Grande era um povoamento de posseiros onde hoje fica o município de Irani/SC. À época a região era disputada por Paraná e por Santa Catarina. Nunca houve, ressalte-se, um entrevero militar entre os dois Estados. De direito o local pertencia a Santa Catarina. O Paraná não aceitava a decisão da suprema corte e insistia em morder um pedaço do vizinho. Vamos aos fatos.
          José Maria, um curador de ervas e conselheiro espiritual, chegara ao Banhado. Tinha vindo de Taquaruçu. Era um líder religioso. Alguns o chamavam de monge. Devido a uma contenda entre coronéis catarinenses, teve que sair às pressas para os Campos de Palmas – toda a região em que ficava o Banhado Grande estava sob controle do Paraná, e no município de Palmas. Era, na verdade, um território livre. Tinha, entretanto, um dono, o coronel Juca Pimpão, de Palmas. Sem nunca ter colocado os pés por lá, tinha dão um jeito de escriturar tudo em seu nome. O governo do Paraná, protegendo o território e defendendo o interesse do coronel, resolve prender os “catarinenses” intrusos.
          Envia o coronel João Gualberto para o Banhado. A tropa militar era composta por 50 praças e sete oficiais. Confiavam cegamente na metralhadora que levavam. Quando José Maria soube que Gualberto estava chegando, propôs conversar, pois não tinha interesse político nem econômico, estava lá por ter sido expulso de Taquaruçu. Gualberto não deu trela, marchou com seu regimento para amarrar os “desordeiros” e levá-los a Curitiba. Quando o dia clareou deu-se o combate. Morreu Gualberto, Morreu José Maria.  A força policial nem chegou a usar a metralhadora, pois essa engasgara. Foi aberto um processo em Palmas, para apurar o combate. É conhecido como o Processo do Irani. Tenho a cópia desse processo digitalizada. Foi feita pelo historiador Paulo Pinheiro Machado e repassada às minha mãos pelo Jornalista catarinense Celso Martins, autor de um magnífico livro sobre o tal combate.
          Ou seja, o Combate do Irani está na origem da Guerra do Contestado. E a data vem e vai, ano após anos, sem ser destacada. Porque será que tentam - e como tentam – esconder a história de luta dos brasileiros? Porque nossos heróis são esquecidos? Será que tem a ver com a formação dos grandes latifúndios? Será que tem a ver com a formação das grandes riquezas? Sugiro, amizade, que adquiras o livro do Celso, O mato do tigre e o campo do gato, e mergulhes no dia 22 de outubro de 1910. Essa, sim uma data que deveríamos ser obrigados a lembrar.