domingo, 19 de setembro de 2010

Sétimo dia - "Se não for o pinus é o que? "

Sétimo dia da expedição


Destino: Santa Maria – Município de Timbó Grande
Distância: 42,5 km – 14 km de asfalto e 28,5 de estrada de terra

          Acordei um pouco antes das sete. Tomei café e conversei um pouco com meus amigos de QG. Saí de Caçador exatamente às 8h30. O frio era intenso devido ao vento forte e constante. Peguei o rumo de Lebom Régis, com destino ao vale de Santa Maria – reduto onde se travou o grande combate do exército. Saindo de Caçador eu segui placa no sentido do aeroporto. Um pouco antes do aeroporto vi uma placa que indicava Timbó Grande. O pedregulho sinalisava meu rumo. A estrada estava deserta. Minha companhia era o vento gelado. Ele não dava trégua. Vez por outra valsava na minha frente e a terra seca, castigada por quase dois meses de estiagem, espalhava uma poeira agitada em forma de redemoinho. Nem preciso dizer que a estrada era ainda pior do que a de ontem. Uma certeza me invadiu: para se abrigar por ali, os sertanejos queriam mesmo fugir de tudo e de todos. Sigo devagar, parando aqui e acolá para tirar umas fotos.

Entrada para Timbó Grande/Santa Maria


A festa do vento
Êta,estrada!
A estrada corta o rio ou é o contrário?

          Por volta das 11 horas chego ao lugar onde está o marco do Contestado. Daqueles colocados pelo governo de Espiridião Amim nos locais de combate. Fica do lado esquerdo da estrada, assim que se desce a serra. É bom sempre pedir informações aos moradores – são poucos, mas prestativos. O monumento estava destruído, as placas jogadas no chão. É o abandono da história, por parte dos governantes. Encosto cada placa na moto e faço uma fotografia. Se eu quisesse poderia levar para casa. Não havia ninguém para cuidar. Um morador local, João Soares, 29 anos, me disse que um caminhão da Celesc bateu no monumento quando manobrava. Segundo ele, já faz mais de três anos. Saí de lá e fui conhecer o cemitério dos jagunços. Quem me levou até lá foi Antenor Meireles Prestes, 58 anos, nascido e criado no lugar. “Meu avô foi jagunço. Ele contava as histórias do tempo dos jagunços e chorava. Começava mas não conseguia terminar. Foi muito sofrimento”, lembrou. Meireles me conduziu até o antigo cemitério. Na verdade, ao que sobrou da cidade dos pés juntos. A maior parte do local foi transformada em açude pelo proprietário, o ex prefeito de Timbó grande.
O que sobrou do marco do Contestado
Placas estão abandonadas

Açude invadiu o cemitério

Meireles - "Meu avô foi jagunço"
           Dalí eu fui para Timbó Grande, onde os jagunços se reorganizaram depois da destruição de Santa Maria. Na frente da igreja católica da cidade tem um marco do Contestado em perfeito estado de conservação. Para alguns historiadores, a igreja foi erguida exatamente no lugar em que ficava a casa de Adeodato, o último líder dos sertanejos. Em seguida fui entrevistar o prefeito de Timbó Grande, Valdir Cardoso dos Santos, 55 anos. Durante todo o trajeto pelo interior do município percebi a imensidão das plantações de pinus elliotis. Perguntei a ele se isso não causaria um desequilíbrio ambiental e ele respondeu que “se não for pinus vai ser o que? “ Pergunto o motivo do descaso com o sítio histórico e ele dize que é de Caçador e mora em Timbó apenas há 26 anos, e por isso não conhece bem a parte histórica do município. Comprometeu-se, porém, a restaurar o marco que está em Santa Maria. “O que tem na frente da igreja foi em quem restaurei”, informa o político e plantador de pinus. 
Igreja onde ficava a casa de Adeodato
Pinus, "Se não for ele é o que?"
           Só me restava voltar. Decidi retornar por outro caminho, pelo asfalto que conduz a Santa Cecília. Dei  uma volta enorme, mas o trajeto compensa porque a estrada é ótima e praticamente não tem trânsito. Ao passar em Lebom Régis fui visitar a casa de dona Nercina do Valle Rocha. O avô dela era padrinho de Adeodato e foi assassinado pelo chefe dos jagunços. Ela mora em uma casa edificada no mesmo local em que residia o avô, Neco Pepe.Nos fundos da residência tem um túmulo erguido no local onde o avô foi fuzilado pelo afilhado. “Foi uma covardia, assassinar o padrinho... Ele trabalhou para meu avô. O pai dele era compadre do meu avô...”,  indigna-se dona Nercina. Quando Adeodato matou Neco Pepe, incendiou a casa. A única coisa que não queimou foi um portão de imbuia. A peça está guardada até hoje dentro de um paiol – claro, fiz uma foto. Esse episódio é contado por Maurício Vinhas de Queiroz em seu livro Messianismo e Conflito Social. Depois de um ótimo café da tarde retornei a Caçador. Estacionei a moto no seminário um pouco antes das 18h30.
Neta de Neco Pepe preserva o lugar onde mataram seu avô


2 comentários:

  1. Como é bom que existam pessoas que se preocupam e tentam preservar a história de nossa região, que foi e é tão explorada. O que dá um grande sentimento de indignação, é saber que um prefeito não conheça a história de sua cidade e ainda seja um plantador de pínus.

    ResponderExcluir
  2. O ANO DE 2014 ESTÁ SENDO PARA NÓS TIMBOGRANDENSES UM ANO DE MUITAS REVOLUÇÕES NO QUE DIZ RESPEITO A CULTURA. O ATUAL PREFEITO ESTÁ MUITO INTERESSADO EM RESGATAR A HISTÓRIA DE TIMBÓ GRANDE DENTRO DO CONFLITO DO CONTESTADO, A SECRETARIA DE EDUCAÇÃO, CULTURA E DESPORTO ESTÁ EMPENHADA EM MUDAR ESSA VISÃO QUE TODOS TEM DE TIMBÓ GRANDE EM RELAÇÃO AO CONTESTADO. ESTE ANO JÁ ENVIAMOS UM PROJETO PARA BRASILIA PEDINDO UMA CASA DE CULTURA, NA LOCALIDADE E REALIZADA A FEIRA CABOCLA, FESTA QUE BUSCA RESGATAR AS RAÍZES CABOCLAS, ESTAMOS TAMBÉM FAZENDO UM LEVANTAMENTO DA SITUAÇÃO DOS MONUMENTOS PARA QUE OS MESMOS SEJAM RESTAURADOS. EM JULHO ACONTECERÁ AQUI EM TIMBÓ GRANDE NO DIA 19 DE JULHO A CAMINHADA DE INVERNO DO CENTENÁRIO COM O PROFESSOR NILSON CESAR FRAGA, ESTÃO TODOS CONVIDADOS A PARTICIPAR. SÃO AÇÕES QUE VISÃO VALORIZAR NOSSA HISTÓRIA, OS RESULTADOS VÃO VIR NO TEMPO CERTO E CONTAMOS COM O APOIO DE TODOS OS AMANTES DO CONTESTADO.

    ResponderExcluir